A HORA DA BODA DEFINITIVA E PLENA
Terminado o tempo de Natal e da Epifania, iniciamos uma etapa litúrgica que se denomina de Tempo Comum, sendo interrompida pelo 1º Domingo da Quaresma. Estamos no ciclo C, e o evangelista deste ano é São Lucas; todavia, neste domingo, excecionalmente, proclamamos um texto exclusivo de São João, que se pode considerar como outra epifania de Jesus, porque, no final da narração, diz-se que Jesus “manifestou a sua glória e os discípulos acreditaram n’Ele”. Em toda a sua vida terrena, Jesus dá a conhecer a sua glória, a sua dignidade e a sua identidade como homem e Filho de Deus. É um caminho que culmina com a sua elevação na cruz, a sua ressurreição e o seu regresso ao Pai. Mas, olhemos para as outras leituras bíblicas. As palavras de Isaías sobre a presença amorosa de Deus entre o povo de Israel podem ser hoje aplicadas à mesma presença de Deus no novo povo de Deus, que é a Igreja. A Igreja não se deve sentir “abandonada” e “deserta”, porque Deus a ama. O Senhor é o esposo da Igreja. Ele está presente na Igreja e nós tempos de ser capazes de sentir a sua presença. Por outro lado, São Paulo convida-nos a colocar à disposição dos outros os nossos dons, “para o bem comum”. É um convite tão urgente e necessário numa sociedade cada vez mais individualista. Todos temos algo para partilhar. O texto do evangelho é a narração das bodas de Caná. Mais do que a narração de um milagre espetacular, como um fundamento ao sacramento do matrimónio, ou como uma prova do poder intercessor de Maria, temos, diante de nós, um texto de catequese muito eloquente. É narrado um banquete de casamento, e este momento evoca as relações entre Deus (o esposo) e a humanidade (a esposa), ou seja, uma relação de fé e de religiosidade. Diz o texto que havia umas talhas de pedra vazias que foram cheias de água, que será transformada em vinho. Elas são a prova de que se está a cumprir o que diz Isaías, na primeira leitura: “serás a predileta do Senhor e a tua terra terá um esposo... como a esposa é a alegria do marido, tu serás a alegria do teu Deus”. Havia água para a purificação, ou seja, a religiosidade judaica tinha ficado reduzida ao que era puro ou impuro, permitido ou proibido. Mas Jesus vem restabelecer a festa e a alegria de uma boda (o vinho evoca sempre a alegria e a festa). A religiosidade da proibição tem de se converter na alegria do encontro íntimo e pessoal com Deus. É nisto que Maria acredita. Maria é uma mulher israelita fiel à aliança com Deus. Recordemos que Jesus a chama de “Mulher”, como acontecerá, também, na cruz, porque não a vê como sua Mãe, mas como uma israelita fiel; por isso, ela recorda as palavras do Êxodo (19,8): “Fazei o que Ele vos disser”. E se Jesus mostra algumas reservas (“Mulher, que temos nós com isso? Ainda não chegou a minha hora”), é porque a “hora” de Jesus é o momento da sua ressurreição, quando for, definitivamente, restabelecida a “nova aliança entre Deus e a humanidade”. Mas, há um pormenor que não pode passar despercebido: a progressiva qualidade do vinho; o melhor vinho é o último a chegar à mesa. A hora da plenitude, da grande festa ainda não tinha chegado, porque a vinda definitiva de Cristo, símbolo da definitiva e plena aliança entre Deus e a humanidade, só acontecerá no final da história. Porém, apesar desta interpretação mais catequética da passagem das bodas de Caná, é evidente que não podemos esquecer o sacramento do matrimónio. Não tenhamos medo de usar a imagem do amor entre esposos para falar da fidelidade de Deus para com a humanidade. É bom darmos conta que existem tantos casais fiéis ao seu projeto e generosos na sua vida partilhada, agradecendo a Deus todos os dons recebidos. Rezemos por todos os casais que estão a viver situações dolorosas e difíceis. Peçamos que Maria seja, mais uma vez, a grande intercessora, diante de Deus, dos pais e das mães, na sua missão de educar os seus filhos e de lhes transmitir os valores do evangelho. |